Qual a sociedade ideal, nossa utopia? Famílias equilibradas,
todos trabalhadores, sem violência alguma, sem droga, álcool, cigarro,
corrupção. Todos puxando a corda para o mesmo lado, respeitando as diferenças e
se esforçando para que elas diminuam. Que todas pessoas com deficiência tenham
as mesmas condições de todos nós. Uma sociedade sem corrupção, agressões,
assédios e afins. Se este é o “ideal”, havemos de convir que estamos longe disso.
Pois bem, não vivemos no mundo ideal. Temos inúmeras
imperfeições dentro de todos os espaços, desde as famílias, ambientes de
trabalho, instituições, na rua, nos espaços públicos. É repetitivo reafirmar
tudo que vimos de ruim a nossa volta, nestes dias difíceis. É natural,
portanto, que o cidadão comum queira se livrar de tudo que lhe choca, que causa
desconforto em nossa sociedade.
Historicamente a humanidade faz isso, afinal: para o doente,
ameaça de contágio, o hospital; para o delinquente, ameaça à segurança, o
presídio; para o ‘louco’, pretensa ameaça, o hospício. Vigiar e punir a
diferença, como pontua Foucault em sua obra. Tira-se da frente dos olhos tudo
aquilo que parece ser uma ameaça. Daí que a pessoa em sofrimento psíquico,
usuária de entorpecentes, por exemplo, nos deixa desconfortáveis. Afinal,
escancaram nossa fragilidade, nossa incapacidade de sermos eternos “cidadãos
perfeitos”, ou “do bem”, como pontuam alguns.
Enquanto sociedade melhoramos nas últimas décadas,
reconhecendo e incluindo os “diferentes”. Surgiram APAE´s, CAPS, residenciais
terapêuticas, entre outros espaços. Hospícios perderam espaço. Como nada na
vida, não há consenso e, é de se entender que alguns continuam com a ideia de
que a melhor medida é “sumir” com os usuários de drogas, por exemplo. É por aí
que tento entender a reação contra o CAPS Álcool e outras drogas “Sim pra
Vida”, localizado na rua Santos Filho, no centro de Lajeado.
O usuário de drogas presente nesta rua, ou na Júlio, no
Parque dos Dick, na praça da Matriz ou outros pontos da cidade incomodam parte
da sociedade por que isto escancara o fato que não estamos no mundo perfeito,
que não somos todos iguais, somos portadores de doenças, de fraquezas,
imperfeições. O caso escancara que dentro de nossas famílias, sejam pobres ou
ricas, de qualquer etnia, temos pessoas doentes usuárias de drogas, sejam
lícitas ou ilícitas e isto é uma coisa extremamente difícil de aceitar.
O movimento da saúde mental vem lutando pela inclusão do
portador de sofrimento psíquico há muitos anos. Profissionais, pais, amigos, o
doente, seguem numa jornada dura, buscando reconhecimento frente a
intolerância. Transferir os problemas para longe dos olhos não resolve. Colocar
o CAPS em algum lugar distante do centro não vai diminuir o número de usuários,
não vai aliviar a consciência social e, ao fim e ao cabo, só reproduz táticas
antigas que a maioria da sociedade condena. A solução? Aceitemos nossa condição
de sociedade que precisa de mais tolerância, que deve reconhecer seus problemas
e enfrenta-los, resgatando a humanidade em nossos atos.